26 de maio de 2012

Google Chrome: o novo dono da web

A supremacia do Internet Explorer (IE) está prestes a acabar. Dados preliminares da consultoria StatCounter, divulgados nesta segunda-feira (21), mostram que o Chrome, o navegador criado pelo Google, conseguiu ficar um pouco à frente do browser da Microsoft em uso mundial. Pode ser apenas uma ultrapassagem temporária, mas uma vitória definitiva do Google será difícil de evitar. O crescimento do Chrome tem sido contínuo desde que o software foi anunciado, há três anos.

Usado por um número cada vez menor de pessoas, o Internet Explorer verá seu longo domínio virar um capítulo na história da internet. Quando o Chrome comemorar seu quarto aniversário, em setembro, já terá se transformado definitivamente no browser mais usado do planeta. A mudança vai iniciar uma nova era na web, em que a Microsoft passará para o posto de coadjuvante depois de 13 anos na liderança.

Ao conquistar a maior base de internautas do mundo, a equipe do Google terá mais força para tentar definir os padrões que achar convenientes para a web, e os seus rivais precisarão se ajustar a essas regras. Rodar complexos aplicativos online ficará mais fácil e haverá mais segurança. Ao mesmo tempo, os dados de navegação da maior parte dos usuários da rede vão passar pelos servidores do Google.

O fim do reinado do IE aparece em projeções matemáticas feitas pela INFO, a partir dos números da StatCounter coletados de setembro de 2008 a fevereiro de 2012. No período, a parcela de mercado do navegador da Microsoft caiu de 67% para 36%, enquanto a do Chrome subiu de 1% para 30%. Se a tendência se mantiver, é certo que o Google chegará ao primeiro lugar em breve. O número de adeptos do Firefox, da Fundação Mozilla, tem diminuído lentamente desde novembro de 2010 e, no mês passado, ficou em 25% do total, o que o mantém na terceira posição. O Safari, da Apple, com somente 7%, avança devagar e por um bom tempo dificilmente sairá do quarto lugar.

Por essa o presidente da Microsoft não esperava. Em setembro de 2009, quando o Chrome tinha um ano de vida e menos de 4% do mercado, Steve Ballmer ridicularizou seu alcance em entrevista ao site TechCrunch. “Nosso concorrente de sucesso é, de longe, o Firefox. O Chrome é uma margem de erro”, disse Ballmer. O IE era usado por 58% dos internautas na época.

Mas a situação começou a mudar em 2010, quando surgiram a galeria de extensões do Chrome e as versões estáveis para Mac OS X e Linux. O ritmo de adoção do browser do Google aumentou ainda mais em 2011, com a estreia da Chrome Web Store, a loja de aplicativos.

O Chrome demorou mais tempo para nascer do que desejavam Larry Page e Sergey Brin, os fundadores do Google. No início da última década, eles já defendiam a criação de um navegador, mas foram barrados por Eric Schmidt, então presidente da empresa. Depois de algumas tentativas, em 2006 Page e Brin montaram um time de talentos, incluindo ex-desenvolvedores do Netscape e da Fundação Mozilla, com a desculpa de que ajudariam a melhorar o Firefox e a fazer extensões do Google e de seus produtos. Foi um golpe de mestre. Com a equipe formada, criar um navegador tornou-se uma vontade do grupo. Schmidt cedeu e o Chrome surgiu dois anos depois.

Marketing de resultados - A simplicidade de uso e a velocidade do programa, presentes desde a estreia, foram fundamentais para que ganhasse terreno sobre os concorrentes. Com uma nova versão disponível a cada seis semanas desde julho de 2010, as inovações tornaram-se bem mais frequentes do que as de seus rivais.

Parte do sucesso também se deve a um investimento pesado do Google em marketing. Sempre que alguém entra no buscador pelo Internet Explorer, uma mensagem no canto superior direito sugere para o internauta baixar um “navegador mais rápido” – claro, o Chrome. A empresa apostou ainda em vídeos virais que destacam qualidades do software ou têm forte apelo emotivo.

Também adotou estratégias agressivas. Passou a fazer campanhas publicitárias milionárias do browser na TV aberta, inclusive no Brasil. Anunciou na mídia impressa, em sites, em pontos de ônibus, em estações de metrô e em outdoors. Na web, uma das campanhas violava regras do próprio Google, o que levou a companhia a admitir o erro e a aplicar uma punição de 60 dias a si mesma. Isso ocorreu porque uma empresa contratada pelo Google pagou para blogs publicarem posts recomendando o navegador. Pelo menos um deles trazia um link para download.

O truque, revelado em janeiro pelo blog SEO Book, ajuda um site a subir artificialmente no ranking. Como represália, a página de download do Chrome teve rebaixado o PageRank, o índice do Google que determina a relevância em buscas.

Controle da privacidade - Não são poucos os motivos que levam o Google a querer ter o navegador mais popular do mundo. “Há muitas razões. A principal delas é que a maior parte do faturamento da empresa vem de anúncios e buscas. Tudo isso passa pelo browser. Por isso, eles precisam ter certeza de que o caminho não está sendo controlado por outra companhia”, disse a INFO David Mitchell Smith, analista do instituto de pesquisas Gartner. Líder por mais de uma década com o IE, a Microsoft é a rival a ser combatida.

Outro motivo para esse comportamento está na vontade de trazer inovações para a internet, tornando os navegadores mais versáteis. À medida que o Chrome incorpora funcionalidades, seus concorrentes também têm de se mexer e melhorar. Isso é bom para os internautas. Durante o longo reinado do IE 6, a web permaneceu estagnada. Com o surgimento do Firefox, mais rápido e seguro, a Microsoft foi forçada a reagir. Mas por trás do progresso trazido pelo Chrome, há o interesse comercial. “Ao transformar a web em algo mais útil para as pessoas, o Google pode mostrar mais anúncios para elas”, afirma Smith.

Isso sem falar na quantidade de informações coletadas quando alguém navega com o Chrome. “O Google coleciona um monte de dados sobre tudo, o que tem causado uma preocupação cada vez maior”, diz Smith. Ainda que a empresa afirme não monitorar individualmente os usuários, os hábitos de cada internauta acabam gerando dados.

O Chrome envia informações para os servidores da companhia em pelo menos 15 situações, de acordo com os termos de privacidade da empresa. Não está claro se tudo isso fica armazenado remotamente, nem quanto tempo leva para ser deletado. Muito menos se apenas o browser utiliza esses dados. Quando alguém digita qualquer coisa na barra de endereços, por exemplo, o texto é mandado para o buscador-padrão, o Google, que pode autocompletar a URL ou sugerir uma pesquisa. Isso se o internauta não alterar as configurações.

Se uma pessoa usar a correção ortográfica, a transmissão também acontece. Para esclarecer esta e outras questões, INFO solicitou ao Google entrevistas com Sundar Pichai, vice-presidente sênior para o Chrome, Ben Goodger e Darin Fischer, engenheiros de software que integram a equipe de desenvolvimento do navegador. Mas o Google afirmou que seus técnicos não estavam disponíveis.

No ano passado, durante o anúncio dos resultados financeiros do primeiro trimestre, Patrick Pichette, vice-presidente sênior e diretor financeiro do Google, explicou por que o browser é importante para a empresa: “O Chrome faz a web avançar. Quando as pessoas o adotam, em vez de ficarem procurando um jeito de fazer buscas, elas têm acesso direto ao buscador do Google pela omnibox (a barra de endereços). Todo mundo que usa o Chrome torna-se dependente de nós, em relação a ter acesso ao Google”.

O investimento pesado em publicidade para promover o browser tem funcionado. Durante a mesma divulgação de resultados, Nikesh Arora, vice-presidente sênior e diretor de negócios da companhia, afirmou que 40% dos 120 milhões de usuários que aderiram ao Chrome em 2010 o fizeram por causa dos esforços de marketing. “Continuaremos a incentivar o Chrome estrategicamente, porque ele não nos traz um único benefício: causa impacto em muitos de nossos outros produtos, que funcionam como parte do Chrome. O valor de um usuário do Chrome é fenomenal”, afirmou.

Concorrência forte - Ainda que o crescimento do Chrome seja acelerado, David Smith, do Gartner, não acredita em monopólio. “Há três concorrentes muito fortes hoje. Não vamos retornar aos dias em que o Internet Explorer tinha 90% do mercado”, diz.

Ao contrário do que ocorreu com o Netscape, que teve um fim trágico, Firefox e IE vão continuar a ser relevantes, com uma enorme base de usuários. Um dos grandes desafios do Google está em conquistar o mercado americano, ainda liderado pelo navegador da Microsoft. No Brasil, o browser do Google chegou ao topo no ano passado.

Mesmo que não atinja um grau de dominação similar ao do IE, o Chrome poderá impor novos padrões à medida que se distanciar dos competidores. Entre as mudanças defendidas pelo Google está a adoção da linguagem Dart, criada pela empresa. Ela substituiria o JavaScript para criar aplicativos.

“Tenho receio de que, com o Dart, o Google vai dividir a comunidade de desenvolvedores e fragmentar o conteúdo na web. Garanto que Apple, Microsoft, Opera e Mozilla nunca vão adicionar a linguagem a seus browsers”, escreveu Brendan Eich, criador do JavaScript e diretor de tecnologia da Mozilla Corporation, ao site Hacker News. “Então, ‘Funciona melhor no Chrome’ ou até ‘Só funciona no Chrome’ serão novas normas decretadas pelo Google."

A capacidade do Chrome de rodar aplicativos online cada vez mais complexos pode se tornar uma vantagem competitiva e forçar os outros navegadores a incorporar essa habilidade. A estreia do game From Dust, da Ubisoft, na loja de aplicativos Chrome Web Store deve ocorrer em breve.

No jogo de estratégia, o jogador assume o papel de uma entidade divina que deve salvar uma tribo. Mas o que há de especial nisso? Embora os cenários estejam em 3D, o programa roda no browser, algo impensável até pouco tempo para um jogo como esse. A equipe de desenvolvimento do Google conseguiu incorporar o Native Client ao Chrome, uma tecnologia que permite a execução de programas mais pesados.

Tudo roda no browser - A mudança abre espaço para a ideia do Google de transformar o browser em um sistema operacional. A crença de que o centro de nossas vidas será a web foi outro motivo para a criação do navegador. Sob esse ponto de vista, instalar programas é uma necessidade. A Chrome Web Store funciona como uma loja de aplicativos tradicional, com um modelo inspirado no dos smartphones. Apesar das limitações, tem dado certo. O Graphic.ly, uma plataforma online que permite comprar e ler quadrinhos, está disponível para o Chrome, mas pode ser acessada por qualquer browser.

A maior quantidade de visitantes, contudo, chega pelo navegador do Google. “Sou fã do apoio que eles dão, tanto para criar um aplicativo como para promovê-lo”, diz Micah Baldwin, presidente da Graphic.ly. Para ele, ainda faltam alguns ajustes para que os programas do Chrome ofereçam uma experiência mais completa.

Contra o Windows - O desdobramento desse conceito são os Chromebooks, laptops com hardware mais básico cujo sistema operacional é uma versão mais simples do Linux, capaz de rodar apenas o navegador Chrome. Os notebooks, que começaram a ser vendidos nos Estados Unidos em junho passado, ligam em cerca de 10 segundos, mas só aceitam aplicativos da Web Store. Além de rápidos, os computadores recebem atualizações automaticamente e usam tecnologia que os tornam mais seguros que um PC com Windows. Em contrapartida, ter uma conexão com a internet é fundamental para usar boa parte dos recursos.

A ideia do Google é competir com a Microsoft, mas, pelo menos até agora, os Chromebooks não obtiveram sucesso. Apenas quatro modelos foram produzidos, por Samsung e Acer. Isso não quer dizer que o conceito tenha fracassado. Nos Estados Unidos, a prefeitura de Orlando integra projeto-piloto com 650 laptops do Google. Os resultados têm sido bons. “Eles são seguros e não precisam de muita manutenção”, diz Rosa Akhtarkhavari, responsável pela TI da prefeitura de Orlando.
Google Chrome
Embora seguros, o Chrome e os Chromebooks não são invulneráveis. A empresa francesa Vupen demonstrou, em março, numa competição de hackers no Canadá, que é possível driblar um dos principais recursos de segurança do browser, o sandbox. “Levamos seis semanas para fazer. Queríamos mostrar que qualquer navegador pode ser comprometido se houver tempo, recursos e motivação para isso”, disse Chaouki Bekrar, presidente da Vupen. O sandbox funciona como uma caixa de contenção contra ameaças. Se um site perigoso é acessado, essa tecnologia impede o código malicioso de ler os dados do PC ou de se instalar no computador.

Para Bekrar, o fato de o Chrome estar prestes a se tornar o mais usado no mundo é uma boa notícia. “Como não temos visto em circulação nenhum tipo de código malicioso que se aproveite de uma vulnerabilidade do Chrome, a internet vai se tornar mais segura”, afirma. Mas a próxima versão do Internet Explorer, que virá com o Windows 8, promete um grau ainda maior de proteção. Pelo visto, a guerra dos browsers ainda está bem longe de terminar.

[Info]




Nenhum comentário:

Postar um comentário

Digite aqui seu comentário.